Com acordo Mercosul-UE, café brasileiro pode ampliar presença no exterior

Café do Brasil

O acordo, quando entrar em vigor, prevê isenção de tarifa para o café torrado e solúvel no prazo de quatro anos. Com isso, os produtos brasileiros chegarão com custos menores ao mercado europeu

Publicado: 23/12/2019 14h56

O Brasil é líder mundial na produção e na exportação de café. Somente no ano passado, produziu 61,7 milhões de sacas de 60 kg de café beneficiado. Trinta e seis milhões de sacas foram exportadas, principalmente de café verde, resultando em divisas de US$ 5,15 bilhões, em 2018. Desse total, cerca de 17,5 milhões sacas (49%) foram embarcada para União Europeia, especialmente, para os mercados da Alemanha, Itália, Bélgica, França e Espanha, segundo dados da Conselho de Exportadores de Café do Brasil (Cecafé).

Aguardado há 20 anos, o acordo entre o Mercosul e a União Europeia (UE) foi firmado em junho deste ano, em Bruxelas. Vários setores da agricultura brasileira poderão se beneficiar com o acordo, entre eles os produtores de café, que estão com grande expectativa.

Foto: Paulo Lanzetta – Embrapa 

Tarifas menores

O acordo prevê a isenção de tarifa para o café verde exportado aos europeus, igualando ao que ocorre atualmente com os processados (solúvel, extratos e café torrado) e assim resolvendo a questão da escalada tarifária. Ao entrar em vigor (o acordo precisa ser aprovado pelos parlamentos dos blocos para começar a vigência), o café torrado e solúvel brasileiro, que têm alíquotas de 9% para entrar na UE, atingirão o livre comércio (sem tarifa) em quatro anos no bloco europeu. Com isso, os produtos brasileiros chegarão com custos menores e mais competitivos ao mercado europeu. 

O diretor de Relações Institucionais da Associação Brasileira da Indústria de Café Solúvel (Abics), Aguinaldo José de Lima, avalia que o produto brasileiro terá melhores condições de competir com os de países que pagam tarifas menores dentro da UE, como é o caso do Vietnã, Colômbia e Equador. “Os vietnamitas têm 2% de tarifa para UE. Perdemos mercado ao longo desses anos exatamente pela tarifa que nos foi imposta de 9%, e prejudicados por regimes preferenciais de tarifas e acordos comerciais com países concorrentes que ganharam espaço, tomando do Brasil”, explica.

A União Europeia foi o segundo maior destino das exportações de café solúvel (466 mil sacas/60kg de solúvel) em 2018. Só perde para os Estados Unidos (o equivalente a 644 mil sacas/60kg).

Com a entrada em vigor do acordo e a extinção da tarifa no período de quatro anos, Lima projeta um crescimento de 35% em volume nos próximos cinco anos.

 O que é o café solúvel?  
Após ser torrado e moído, o café passa por um processo que permite a solubilização, ou seja, ser misturado diretamente na água. Cerca de 25% do café consumido na União Europeia são do tipo solúvel. No Reino Unido, chega a 69%. A praticidade é um dos atrativos da bebida.

Conforme o acordo, parte do café verde importado pela UE para produção de torrado (40%) e solúvel (entre 40% e 50%) deve ser proveniente do Brasil, exigência para que os europeus possam vender café torrado e solúvel com redução de alíquotas ao Mercosul. No caso do bloco sul-americano, também há a necessidade de se utilizar parte de café verde brasileiro para o produto sul-americano ter tarifa preferencial na UE.

O presidente executivo do Conselho Nacional do Café (CNC), Silas Brasileiro, avalia que “os principais segmentos agraciados serão os industriais da torrefação e de solúvel com a desgravação da atual taxa de 9%, que incide sobre nossos produtos que ingressam no bloco europeu, até que chegue a zero nos próximos quatro anos”.

“Esse fato também remete benefício diretamente à produção cafeeira nacional, haja vista que nossas indústrias são importantes parceiros e clientes dos cafés do Brasil”. 

Foto: iStock/Mapa

Já a diretora da Associação Brasileira de Cafés Especiais (BSCA, na sigla em inglês), Vanúsia Nogueira, informou que empresas internacionais, de cápsulas e solúveis, já estão prospectando a possibilidade de instalação de unidades, como de torrefação, no país.

“Estados como Espírito Santo, São Paulo e Minas já receberam consultas de multinacionais espanholas e suíças para a montagem dessas indústrias no país para posterior exportação. O que o produtor brasileiro vai ganhar com isso? O poder de barganha. Se ele se organizar, principalmente, nessas regiões de IGs (Indicação Geográfica) poderão fazer acordos interessantes com essas empresas”, destaca Vanúsia Nogueira.

Para o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Café (ABIC), Ricardo de Souza Silveira, um ponto que precisa ser debatido é a possibilidade de se abrir a importação de café cru pelo Brasil para produção de blends (misturas), produto que agrada o paladar dos europeus.

O presidente do Conselho Deliberativo do Cecafé, Nelson Carvalhaes, ressaltou que o café brasileiro já atende às exigências do mercado europeu.

É válido destacar que o café brasileiro é muito bem posicionado na comunidade europeia”, comenta Carvalhaes.

“Tem rastreabilidade, é sustentável. Somos um país com leis sociais e ambientais muito rígidas e isso atende os mais exigentes consumidores da União Europeia. Temos estrutura, tecnologia, áreas de cultivo, pesquisa, comércio organizado e logística preparada e o acordo com certeza estimulará a nossa indústria e fortalecerá a atuação do Brasil no exterior, aumentando laços e incrementando parcerias. O Brasil volta a ser inserido na política de acordos internacionais de uma maneira inteligente, produtiva”.

Na avaliação do diretor de Comercialização e Abastecimento do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Silvio Farnese, o acordo ajudará na formação de preços para o produtor nacional. “Isso certamente criará internamente maior interesse em novas plantas industriais para atender ao crescimento das exportações, melhorando significativamente a formação de preços para o produtor nacional”.

* Reportagem de Inez De Podestà

** Colaboração do classificador e degustador oficial de café da Superintendência Federal de Agricultura, Pecuária e Abastecimento em São Paulo, o auditor federal Celso Ricardo Bucker Franchini, integrante da Unidade Técnica Regional de Agricultura, Pecuária e Abastecimento de Ribeirão Preto.

Fonte: agricultura.gov.br