RESOLUÇÃO CAMEX Nº 47, DE 5 DE JULHO DE 2017
DOU 07/07/2017
Esclarece que os alhos frescos ou refrigerados, independentemente de quaisquer classificações, quando originários da República Popular da China, estão sujeitos à incidência do direito antidumping instituído pela Resolução CAMEX n° 80, de 3 de outubro de 2013.
O COMITÊ EXECUTIVO DE GESTÃO - GECEX - DA CÂMARA DE COMÉRCIO EXTERIOR - CAMEX, no uso da atribuição que lhe confere o inciso II do § 4º do art. 5º do Decreto nº 4.732, de 10 de junho de 2003, e com fundamento no inciso XV do art. 2º do mesmo diploma legal,
Considerando o que consta dos autos do Processo MDIC/SECEX 52272.000184/2017-68, resolve, ad referendum do Conselho:
Art. 1º Encerrar a avaliação de escopo e determinar que as importações de alhos frescos ou refrigerados, independentemente de quaisquer classificações, quando originários da República Popular da China, estão sujeitas à incidência dos direitos antidumping instituídos pela Resolução CAMEX n° 80, de 3 de outubro de 2013.
Art. 2º Tornar públicos os fatos que justificaram a decisão, conforme consta do Anexo a esta Resolução.
Art. 3º Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.
MARCOS PEREIRA
Presidente do Comitê Executivo de Gestão
1.1. Da
investigação original
Em 31 de maio de 1994, a Associação Goiana dos Produtores de Alho
- Agopa - protocolou petição de início de
investigação de dumping nas exportações para o Brasil de alhos
frescos ou refrigerados, originárias da República Popular da China (China),
comumente classificadas nos subitens 0703.20.10 e 0703.20.90 da Nomenclatura
Comum do Mercosul - NCM, e de dano à indústria doméstica decorrente de tal
prática.
A investigação foi iniciada por meio da Circular Secex nº 87, de 5
de dezembro de 1994, publicada no Diário Oficial da União (DOU) de 8 de
dezembro de 1994. Na sequência do processo, foi imposto direito antidumping provisório de 36% por intermédio da
Portaria Interministerial MICT/MF nº 13, de 29 de agosto de 1995, publicada no
DOU de 30 de agosto de 1995.
Em 18 de janeiro de 1996, por meio da Portaria Interministerial
MICT/MF nº 3, foi encerrada a investigação com a aplicação de direito antidumping definitivo, na forma de alíquota
específica de US$ 0,40/kg, com prazo de vigência de até cinco anos.
1.2. Da
primeira revisão
Em 20 de junho de 2000, a Secex publicou a Circular nº 20, de 19
de junho de 2000, informando que o prazo de vigência do direito antidumping estabelecido pela Portaria
Interministerial MICT/MF nº 3, de 1996, expiraria em 18 de janeiro de 2001. A
Associação Nacional dos Produtores de Alho - Anapa
manifestou interesse na revisão do referido direito e, em 24 de outubro de 2000,
apresentou petição solicitando início de revisão de final de período do direito antidumping em questão.
A revisão foi iniciada por meio da Circular Secex nº 1, de 8 de
janeiro de 2001, publicada no DOU de 9 de janeiro de 2001. Concluídas as
análises pertinentes, a revisão foi encerrada, por meio da Resolução Camex nº
41, de 19 de dezembro de 2001, publicada no DOU de 21 de dezembro de 2001, que
alterou o direito antidumping aplicado sobre as importações
brasileiras de alhos frescos ou refrigerados, comumente classificadas nos itens
0703.20.10 e 0703.20.90 da Nomenclatura Comum do Mercosul - NCM, originárias da
China, para a alíquota específica fixa de US$ 0,48/kg, com vigência de até
cinco anos.
1.3. Da
segunda revisão
Em 9 de junho de 2006, a Secex publicou a Circular nº 43, de 7 de
junho de 2006, informando que o prazo de vigência do direito antidumping estabelecido pela Resolução Camex nº
41, de 2001, iria expirar em 21 de dezembro de 2006. A Anapa
manifestou interesse na revisão e, em 21 de setembro daquele ano, protocolou,
no Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior - MDIC, petição
de início da revisão de final de período do direito antidumping em questão.
A revisão foi iniciada por meio da Circular Secex nº 84, de 13 de
dezembro de 2006, publicada no DOU de 14 de dezembro de 2006 e encerrada por
intermédio da Resolução Camex nº 52, de 23 de outubro de 2007, publicada no DOU
de 14 de novembro de 2007, que alterou o direito antidumping aplicado sobre as importações
brasileiras de alhos frescos ou refrigerados, comumente classificadas nos
subitens 0703.20.10 e 0703.20.90 da Nomenclatura Comum do Mercosul - NCM,
originárias da China, para a alíquota específica fixa de US$ 0,52/kg, com
vigência de até cinco anos.
1.4. Da
terceira revisão
A Circular Secex nº 55, de 8 de novembro de 2011, publicada no DOU
de 10 de novembro de 2011, tornou público que o direito antidumping aplicado às importações brasileiras de
alhos frescos ou refrigerados originárias da China, estabelecido pela Resolução
Camex nº 52, de 2007, seria extinto em 14 de novembro de 2012. A Anapa manifestou interesse na revisão e, em 10 de agosto de
2012, protocolou, no Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio
Exterior - MDIC, petição de início de revisão de final de período do direito antidumping em questão.
A revisão foi iniciada por meio da Circular Secex nº 59, de 9 de
novembro de 2012, publicada no DOU em 12 de novembro de 2012 e encerrada por
intermédio da Resolução Camex nº 80, de 3 de outubro de 2013, publicada no DOU
de 4 de outubro de 2013, que alterou o direito antidumping aplicado sobre as importações
brasileiras de alhos frescos ou refrigerados, comumente classificadas nos
subitens 0703.20.10 e 0703.20.90 da Nomenclatura Comum do Mercosul - NCM,
originárias da China, para a alíquota específica de US$ 0,78/kg, com vigência
de até cinco anos.
1.5. Da
primeira avaliação de escopo
Em 9 de outubro de 2015, a empresa Island
International Trade Ltda. protocolou petição de
avaliação de escopo com o objetivo de determinar se os alhos frescos ou
refrigerados das classes 3 e 4 estariam sujeitos à aplicação do direito antidumping vigente sobre as importações de alhos
frescos ou refrigerados, originárias da China.
A avaliação de escopo foi iniciada por meio da Circular Secex nº
69, de 29 de outubro de 2015, publicada no DOU de 3 de novembro de 2015 e
encerrada por intermédio da Resolução Camex nº 13, de 18 de fevereiro de 2016,
publicada no DOU de 19 de fevereiro de 2016, tendo esclarecido que as
importações de alhos frescos ou refrigerados de classes 3 e 4 estão sujeitas à
aplicação dos direitos antidumping sobre as importações de alhos frescos
ou refrigerados da China, conforme a Resolução Camex nº 80, de 3 de outubro de
2013.
2. DA
SOLICITAÇÃO DE AVALIAÇÃO DE ESCOPO
2.1. Da
petição
Em 17 de fevereiro de 2017, a Anapa
protocolou petição, no Sistema Decom Digital (SDD),
solicitando a realização de avaliação de escopo acerca da sujeição de todo
grupo, subgrupo, classe ou tipo de alho, independentemente de qualquer critério
de classificação, à incidência do direito antidumping vigente sobre as importações de alhos
frescos ou refrigerados, originárias da China.
2.2. Do
início da avaliação de escopo
Tendo sido apresentados elementos suficientes que indicavam haver
dúvida quanto à incidência ou não de cobrança de direito antidumping sobre o alho fresco e refrigerado,
independentemente de quaisquer classificações, importados da China, foi
elaborado o Parecer Decom nº 9, de 6 de março de
2017, propondo o início da avaliação de escopo.
Com base no parecer supramencionado, por meio da Circular Secex nº
15, de 7 de março de 2017, publicada no DOU de 8 de março de 2017, foi iniciada
a avaliação em tela.
Destaque-se que, nos termos do parágrafo único do art. 154 do
Decreto nº 8.058, de 2013, a avaliação conduzida ao amparo processo
administrativo em tela possui caráter interpretativo, não alterando o escopo do
direito antidumping vigente.
2.3. Da
habilitação das partes interessadas
De acordo com o item 2, da Circular Secex nº 69, de 2015, as
partes interessadas tiveram o prazo de 15 dias da data do início da avaliação
de escopo para se habilitarem.
A ANIABrasil - Associação Nacional dos
Importadores de Alimentos e Bebidas, entidade brasileira representativa do
setor importador de alho, solicitou habilitação no processo como parte
interessada, tempestivamente, no dia 27 de março de 2017. Por meio do Ofício nº
984/2017/CGSC/Decom/Secex, de 27 de março de 2017,
solicitou-se a regularização da procuração apresentada e, após envio de novos
documentos de habilitação em 4 de abril de 2017, a entidade foi considerada
parte interessada na avaliação em questão, nos termos do inciso II do § 2º do
art. 45 do Decreto nº 8.058, de 26 de julho de 2013.
As importadoras Oceano Azul Alimentos Ltda., ME RJ Importação e
Distribuição Eirelle, Comercial de Alhos e
Condimentos Mattos Ltda., Lecargo Comércio Importação
e Exportação Eireli, Massy
do Brasil Comércio Exterior Ltda. também solicitaram tempestivamente
habilitação no processo como partes interessadas nos dias 14, 15, 16, 22 e 23
de março de 2015, respectivamente. As empresas foram consideradas partes
interessadas na avaliação em questão, nos termos do inciso II do § 2º do art.
45 do Decreto nº 8.058, de 2013.
2.4. Da
audiência
Conforme previsão contida no parágrafo único do art. 152 do
Decreto nº 8.058, de 2013, as empresas ME RJ Importação e Distribuição Eirelle, Oceano Azul Alimentos Ltda. e Lecargo
Comércio Importação e Exportação Eireli solicitaram
nos dias 20, 21 e 22 de março de 2017, respectivamente, a realização de
audiência com o objetivo de esclarecer aspectos relativos ao escopo da medida antidumping em vigor.
Considerando que a solicitação foi apresentada tempestivamente, o
pedido foi deferido em 28 de março de 2017, ocasião em que expediu os Ofícios nºs 985 a 991/2017/CGSC/Decom/Secex,
por meio dos quais convocou as partes interessadas habilitadas para a
realização da audiência.
A audiência foi realizada no dia 17 de abril de 2017, no auditório
do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços. Na ocasião, estiveram
presentes, além dos servidores do Departamento de Defesa Comercial,
representantes da Anapa e representantes das empresas
importadoras Oceano Azul Alimentos Ltda., ME RJ Importação e Distribuição Eirelle, Comercial de Alhos e Condimentos Mattos Ltda., Lecargo Comércio Importação e Exportação Eireli e Massy do Brasil Comércio
Exterior Ltda.
O termo de audiência, bem como a lista de presença com as
assinaturas das partes interessadas que compareceram à audiência, integram os
autos do processo.
As manifestações apresentadas durante a realização da audiência e
reduzidas tempestivamente a termo estão apresentadas neste documento.
2.5. Do
encerramento da fase de instrução
De acordo com o estabelecido no parágrafo único do art. 149 do
Decreto nº 8.058, de 2013, foram concedidos trinta dias contados da data de
publicação da Circular Secex para que as partes interessadas pudessem se
manifestar por escrito ou submeter elementos de prova. Todavia, em virtude da
realização de audiência pública no dia 17 de abril de 2017, e em consonância ao
art. 15 do Portaria nº 42, de 2016, o prazo para elaboração da determinação
final do processo foi prorrogado para 120 dias contados do início do processo.
Nesse sentido, prorrogou-se também o prazo de instrução da avaliação de escopo
em tela, que passou a ser de 60 dias contados do início do processo e se
encerrou em 8 de maio de 2017.
No prazo regulamentar, manifestaram-se acerca da avaliação de
escopo, além da peticionária, a Ania e os
importadores ME RJ Importação e Distribuição Eirelle,
Lecargo Comércio Importação e Exportação Eireli e Massy do Brasil Comércio
Exterior Ltda., cujos comentários constam deste documento.
Deve-se ressaltar que, no decorrer da avaliação de escopo, as
partes interessadas puderam obter vistas de todas as informações não
confidenciais constantes do processo, por meio do acesso ao Sistema Decom Digital, tendo sido dada oportunidade para que
defendessem amplamente seus interesses.
3. DO
PRODUTO OBJETO DA PETIÇÃO DE AVALIAÇÃO DE ESCOPO
De acordo com o inciso I do art. 147 do Decreto nº 8.058, de 26 de
julho de 2013, a avaliação de escopo deverá ser solicitada por meio de petição,
devidamente fundamentada, que conterá descrição detalhada do produto a ser
avaliado, acompanhada dos elementos de prova pertinentes, incluindo suas
características técnicas e seus usos, bem como a sua classificação tarifária na
Nomenclatura Comum do Mercosul - NCM, além de explicação pormenorizada das razões
que levaram o peticionário a entender que o produto está sujeito ao direito antidumping.
3.1. Da
descrição do produto objeto da avaliação do escopo
O produto objeto da petição de avaliação de escopo consiste no
alho fresco e refrigerado, definido como sendo o bulbo da espécie Allium Sativum, independentemente de quaisquer
classificações, seja em classes, grupos ou tipos, comumente classificado nos
subitens 0703.20.10 e 0703.20.90 da NCM.
3.2. Das
razões que levam o peticionário a entender que o produto está sujeito à medida antidumping
A Anapa mencionou, inicialmente, a
definição do produto objeto da investigação constante da Resolução Camex nº 80,
de 3 de outubro de 2013, por meio da qual o direito antidumping fora prorrogado por um prazo de até
cinco anos. Conforme item 3.1. do Anexo I da referida
Resolução, o produto objeto da revisão seria o bulbo da espécie Allium Sativum que,
independentemente de sua coloração, seria classificado no subgrupo dos alhos
nobres, das classes 5, 6 e 7, do tipo Extra. No entanto, em seu artigo 1º, a
Resolução apenas informaria a prorrogação da aplicação de direito antidumping definitivo, por um prazo de até 5
(cinco) anos, sobre as importações brasileiras de alhos frescos ou
refrigerados, originárias da China.
Em função da mencionada inconsistência, em 9 de outubro de 2015, a
empresa Island International
Trade Ltda. protocolou petição de avaliação de escopo com o objetivo de
determinar se os alhos frescos ou refrigerados das classes 3 e 4 estariam
sujeitos à aplicação do direito antidumping vigente sobre as importações de alhos
frescos ou refrigerados, originárias da China.
Efetivamente, constatou-se, a partir da análise dos argumentos
apresentados pela Island, que havia margem
interpretativa aos importadores quanto à incidência ou não da medida antidumping sobre os alhos de classes 3 e 4. Após
a conclusão do processo de avaliação de escopo, publicou-se a Resolução Camex
nº 13, de 2016, que esclareceu que as importações de alhos frescos e
refrigerados de classes 3 e 4 estão sujeitas à aplicação do direito antidumping.
A esse respeito, a Anapa ressaltou que,
ainda que as análises conduzidas naquela avaliação de escopo tenham definido
que o direito antidumping "incide sobre toda e qualquer
classificação de alho", o art. 1º da referida Resolução faz menção
expressa somente aos alhos de classes 3 e 4, objeto do pleito mencionado.
Diante disso, a peticionária ressaltou que vários importadores
teriam ingressado com ações judiciais para impedir a incidência do direito antidumping sobre as importações de alho tipo
especial, pois, segundo essas importadoras, com base nas Resoluções Camex nº
80, de 2013, e nº 13, de 2016, o referido direito antidumping incidiria somente sobre as importações
de alhos das classes 3, 4, 5, 6 e 7, do subgrupo nobre e do tipo Extra.
Ainda segundo a peticionária, a tese defendida pelas importadoras,
e acolhida em alguns juízos, seria de que, ainda que a Resolução Camex mencione
a existência de todas as classificações discriminadas na Portaria Mapa nº 242,
de 1992, alhos que não se enquadrassem nas Classes 3, 4, 5, 6 e 7, no Subgrupo
nobre e no Tipo Extra estariam isentos da cobrança do direito antidumping.
A esse respeito, a Associação afirmou que alguns juízes estariam
ignorando a interpretação sistemática e teleológica das normativas que regem a
matéria. Nesse sentido, a Anapa mencionou ofício de
esclarecimento emitido pela Camex, segundo o qual a medida instituída pela
Resolução Camex nº 80, de 2013, incidiria sobre as importações de alhos frescos
ou refrigerados originárias da China, independentemente de qualquer
classificação. De acordo com trecho de decisão judicial apresentada pela Anapa, "um ofício não teria o condão de alterar o
entendimento firmado após extenso procedimento administrativo, com a
participação dos exportadores chineses, dos importadores e dos produtores de
alho".
Nesse contexto, a Anapa argumentou que,
por ocasião da primeira avaliação de escopo, teria ficado claro que o direito antidumping incidente sobre as importações de alho
da China não seria limitado a qualquer classificação mencionada pela Portaria
Mapa nº 242, de 1992. Para fundamentar sua afirmação, a peticionária incluiu um
trecho do Anexo I da Resolução Camex nº 13, de 2016, que reconheceria um
equívoco quando da descrição do objeto da revisão do direito antidumping:
Conclui-se, portanto, que a análise a ser efetuada nesta avaliação
deve ter foco no conceito de produto objeto da medida antidumping,
determinado pela Resolução Camex nº 80, de 2013, com o objetivo de determinar e
esclarecer, em vista dos argumentos apresentados pelas partes interessadas, o
escopo do direito por ela prorrogado. Nesse contexto, imprescindível se torna
reconhecer a existência de equívoco no texto da Resolução Camex nº 80, de 2013,
que definiu o produto objeto da medida antidumping, o que, de fato, gerou
insegurança jurídica e incerteza na sua aplicação. Como mencionado ao início da
avaliação de escopo, o art. 1º da Resolução Camex nº 80, de 3 de outubro de
2013, se restringiu a informar a prorrogação do direito antidumping aplicado sobre as importações de alhos
frescos ou refrigerados, originárias da China, de forma genérica, sem fazer
referência a qualquer tipo de classificação adotada pelo Ministério da
Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Por outro lado, o Anexo da referida
Resolução detalhou a definição do produto objeto do direito antidumping,
ao fazer referência explícita aos alhos classificados como das classes 5, 6 e
7. A aparente inconsistência gerou incertezas quanto à abrangência do direito.
Além disso, durante o procedimento de avaliação de escopo, constatou-se haver
também discrepância nas descrições constantes no próprio item relativo à
definição de produto objeto da medida apresentada no Anexo da Resolução Camex
nº 80, de 2013.
A peticionária ressaltou ainda que na análise sobre a existência
de dumping, dano e nexo causal, por ocasião da última revisão do
direito antidumping do
alho chinês, todos os dados teriam sido colhidos e analisados sem se fazer
qualquer distinção entre as classificações do produto, ou seja, teria sido
utilizado como parâmetro o alho comum, fresco ou refrigerado, sem levar em
consideração sua espécie ou subespécie.
Portanto, segundo a Anapa, os
importadores estariam se beneficiando de uma manobra jurídica para não cumprir
com um dever legal, prejudicando assim todos os produtores nacionais, além dos
cofres públicos.
Adicionalmente, a Anapa apresentou os parâmetros
utilizados para fins da classificação do alho. Segundo a Associação, a
definição do grupo se relacionaria com a coloração da película do bulbilho. Já
a classe seria verificada de acordo com o maior diâmetro transversal do bulbo.
Quanto a isso, a Anapa destacou que a China
utilizaria classificação distinta daquela definida pela Portaria nº 242 do
Mapa, ao adotar diferentes intervalos de diâmetro, a fim de definir as classes.
Com relação ao subgrupo e ao tipo, seriam considerados, respectivamente, o
número de bulbilhos por bulbo e o percentual de defeitos gerais e/ou graves
identificados no alho. Tendo em vista a especificidade da matéria, a Anapa ressaltou a impossibilidade fática da exclusão de
determinadas categorias do produto da incidência do direito antidumping.
Por todo o exposto, a peticionária defendeu que o direito antidumping deveria incidir sobre todas as
importações de alho originárias da China, independentemente de quaisquer
critérios de classificação. Nesse contexto, tendo em vista a prática de alguns
importadores, endossadas por decisões judiciais acerca da matéria, a Anapa solicitou o início de procedimento de avaliação de
escopo a fim de dirimir dúvidas quanto à incidência do direito antidumping,
tendo em vista as diferentes classificações do produto.
3.3. Das
manifestações das partes interessadas acerca do escopo da medida antidumping
Em 21 de março de 2017, a empresa ME RJ Importação e Distribuição Eireli protocolou solicitação de realização de audiência
acompanhada de manifestações acerca da avaliação de escopo em tela.
Inicialmente, a empresa ressaltou que desde a Resolução Camex nº 80, de 2013,
haveria dúvida em relação à aplicação do direito antidumping sobre determinados tipos de alho. A
empresa ressaltou ainda a definição do produto constante da referida resolução
e a interpretação dada a ela, por meio da Resolução Camex nº 13, de 2016.
Nesse contexto, a empresa afirmou que seria importante mencionar,
antes de adentrar a discussão da definição do produto em si, o reconhecimento
da China como economia de mercado, desde 11 de dezembro de 2016, o que
representaria uma alteração de circunstâncias. Segundo a empresa, os produtos
chineses deveriam ter o mesmo tratamento concedido a outros países da OMC e
seus produtos não deveriam ser "sobretaxados por direitos antidumping".
Ainda a esse respeito, a ME RJ afirmou que eventuais investigações antidumping contra a China deveriam ter como
referência os valores dos produtos comercializados em seu mercado interno. Isso
deveria ser aplicado para o cálculo dos direitos antidumping a serem cobrados sobre as importações
de alhos chineses. Com relação a esses direitos, a empresa afirmou que teriam
apresentado aumentos sucessivos ao longo dos anos da mesma forma que os preços
do alho nacional.
Ainda, segundo a empresa, a produção nacional de alho não seria
suficiente para atender o consumo brasileiro do produto, havendo, portanto,
risco de desabastecimento do mercado, o que demonstraria que o direito antidumping em vigor não seria mais necessário e
justificável, tanto do ponto de vista jurídico, como econômico.
Com relação à avaliação de escopo em curso, a ME RJ afirmou haver
dúvidas quanto à incidência do direito, que prejudicaria os princípios da
segurança jurídica, legalidade e razoabilidade.
Nesse sentido, a empresa destacou a existência de "algumas
poucas ações judiciais", nas quais o Poder Judiciário estaria aplicando
entendimento de que o direito não incidiria sobre determinados tipos de alho.
A esse respeito, segundo a empresa, caso julgue-se necessária a
revisão do escopo da medida, determinando que todos os tipos e classes de alho
estariam sujeitos à cobrança do direito antidumping, certamente haveria
"uma onda de ações judiciais multimilionárias" no sentido de que
fosse restituído todo o valor de direito antidumping pago indevidamente. Segundo a empresa:
Se Anapa, Decom
e Secex reconhecem, em 2017, que há necessidade de determinar o direito antidumping para todo tipo e classe de alho
chinês, todos os valores anteriormente pagos seriam indevidos e, portanto,
sujeitos à restituição, mas não para poucos importadores, mas sim para todos os
importadores que pagaram indevidamente tal direito antidumping,
reconhecido pelo próprio agente competente (Decom/Secex)
como pela indústria nacional (Anapa), de forma
explícita e expressa.
A ME RJ afirmou concordar com a conclusão da Anapa
de que o direito somente seria aplicado ao "alho subgrupo nobre, classes
3, 4, 5, 6 e 7, do tipo extra", não estando prevista, de forma clara e
inequívoca, sua aplicação sobre o alho do tipo especial e comercial. Segunda a
empresa, até a presente data, o direito antidumping somente seria devido sobre as
importações de alho do tipo extra.
Diante do exposto, além da realização de audiência, a empresa
solicitou envio de questionários e realização de verificações in
loco. Ademais, requereu revisão do escopo, levando-se em conta a alteração
das circunstâncias, tendo em vista que a China passou a ser considerada uma
economia de mercado, o que tornaria indevido o direito antidumping vigente. Por fim, a empresa solicitou
o indeferimento do pedido de avaliação de escopo da Anapa
e o encerramento do procedimento sem qualquer resolução de mérito ou alteração
da legislação vigente, em respeito aos princípios da segurança jurídica,
legalidade, irretroatividade das normas (salvo para beneficiar o contribuinte)
e razoabilidade.
Em manifestação protocolada em 23 de março de 2017, a Lecargo Comércio, Importação e Exportação Eireli afirmou que o pedido de avaliação de escopo da Anapa consistiria em "manobra desleal, com a
utilização indevida de instrumento de política econômica do Estado
Brasileiro".
A empresa ressaltou então a legitimidade da sua intervenção, tendo
em vista tratar-se de importadora do produto objeto do direito antidumping.
Ademais destacou seu interesse econômico e jurídico no pleito, uma vez que
teria direito a atuar em ambiente saudável de competição, em que o controle de
legalidade do Estado Brasileiro pudesse ser preservado pelo Poder Judiciário.
Nesse sentido, a empresa ressaltou ser beneficiária de decisão judicial que
"considerou relevante a linha exegética censurada no presente procedimento".
Nesse sentido, a Lecargo apresentou, anexa a sua
manifestação, decisão de agravo de instrumento por ela interposto.
A Lecargo afirmou, nesse contexto, que a
Anapa pretenderia, por meio do processo de avaliação
de escopo, "tornar ineficazes os provimentos judiciais em pleno
vigor". Nesse sentido, ainda que possua caráter interpretativo, a
avaliação de escopo não poderia ser conduzida pela Administração Pública com a
finalidade de "driblar respeitáveis decisões judiciais e, ipso
facto, substituir juízes e tribunais brasileiros em sua função
jurisdicional". Segundo a Lecargo:
Vale dizer, nada obstante os poderes constituídos sejam autônomos
e independentes e exista uma margem de interseção entre suas funções, não há
legitimidade na usurpação de competências e no emprego arbitrário de funções em
desprestígio da ação de um sobre o outro. Nesse passo, a orientação decisória
dos tribunais não deixa margem a dúvidas sobre a repulsa judicial.
A empresa apresentou então trechos de duas decisões judiciais,
sendo uma delas referente à determinação de intervenção federal, diante de
recusa de cumprimento de decisão judicial pelo executivo estadual, e outra
relativa a entendimento de que não seria viável a rediscussão de matéria sub
judice na esfera
administrativa.
Pelo exposto, a empresa concluiu pela "inequívoca
ilegitimidade da conduta administrativa", de modo que o processo de
avaliação de escopo representaria desvio de finalidade, pois não pretenderia
interpretar o escopo de um direito antidumping, mas sim revisar decisões
judiciais.
A Lecargo afirmou que o entendimento do
Poder Judiciário estabeleceria que a regra contida no art. 2º da Resolução
Camex nº 80, de 2013, vincularia a limitação ali exposta aos motivos constantes
do anexo do normativo, o qual, expressamente, delimitaria o alcance da medida antidumping.
A esse respeito, a empresa citou trecho de julgado do Tribunal Regional Federal
da 2ª Região, com base no qual concluiu que a avaliação de escopo não poderia
ampliar uma regra, conforme vontade dos "únicos beneficiários do
protecionismo em foco".
A empresa reafirmou entendimento de que o processo de avaliação de
escopo não teria o condão de dar interpretação extensiva ao objeto da Resolução
Camex nº 80, de 2013. Isso não obstante, a empresa
ressaltou ser necessário considerar alguns aspectos importantes para fins de
instrução do referido processo, tais como o fato de que "a cláusula que,
na adesão da China à Organização Mundial do Comércio, a colocava em
desigualdade nas disputas sobre antidumping, deixou de vigorar no
último 11 de dezembro de 2016". A empresa mencionou, ainda a esse
respeito, protocolo de entendimentos de 2004, por meio do qual o Brasil teria
reconhecido a China como economia de mercado e apresentou documento anexo à
manifestação com cópias de diversas notícias acerca do tema.
A mudança de status da China deveria servir, segundo a Lecargo, como subsídio para orientar uma redeterminação, de ofício, da "medida protecionista em
pauta", cuja vigência apenas teria se prestado a compelir o consumidor
brasileiro a pagar por um dos alhos mais caros do mundo, não havendo, por parte
do poder público, qualquer fiscalização em relação "aos beneficiários do
privilégio defendido pela Anapa". A empresa
apresentou documento anexo à manifestação com diversas cotações de alho em
diferentes estados do Brasil.
Por todo o exposto, a empresa, além de solicitar a realização de
audiência, requereu notificação do Ministério Público, por se tratar de
processo cujo objetivo seria extrair eficácia de diversos provimentos
judiciais. A esse respeito, a empresa apresentou, anexo à manifestação,
documento com cópias de diversas decisões judiciais relativas à cobrança de
direito antidumping.
A importadora Massy do Brasil Comércio
Exterior Ltda., em manifestação protocolada em 7 de abril de 2017, apresentou
argumentos a serem tratados na audiência. Inicialmente, a empresa ressaltou que
há mais de 20 anos viria sendo aplicado direito antidumping sobre as importações de alho chinês,
sendo que o último processo de revisão teria culminado com a publicação da
Resolução Camex nº 80, de 2013, que estendeu por mais 5 anos a aplicação do
referido direito.
A importadora afirmou que, com base na análise das resoluções que
deram origem ao direito, e de todas as demais que prorrogaram o direito sobre
as importações de alho da China, teria se criado uma interpretação equivocada
acerca do produto objeto do dumping.
Segundo a importadora, o produto objeto do direito antidumping sempre teria sido definido de acordo
com a Portaria Mapa nº 242, de 1992, que dispõe sobre a classificação do alho
em grupos, subgrupos, classes e tipos. Nesse sentido, a Resolução Camex nº 80,
de 2013, teria definido o produto objeto do direito como o alho
"classificado no subgrupo de alhos nobres, das classes 5, 6 e 7 do tipo
extra".
Nesse contexto, a referida resolução Camex não teria deixado
dúvidas de que a
"[...] medida antidumping não se estende a qualquer tipo de
alho, independente de coloração, subgrupo, classe ou tipo, tal como pretende a Anapa, mas tão somente ao produto que se enquadre nas
características previstas na norma."
A importadora ainda argumentou que a própria indústria doméstica
produziria apenas os alhos roxos, do subgrupo de alhos nobres, das classes 5, 6
e 7 e tipo extra. Além disso, segundo a Massy, o
valor normal adotado por ocasião da última revisão, com base nas exportações de
alho da Argentina, também teria sido apurado com base no alho nobre, das
classes 5, 6 e 7, do tipo extra.
A empresa Massy alegou então que ela
importaria apenas o alho do tipo especial, de qualidade inferior ao alho nobre,
com mais defeitos agregados, diferente do alho nacional. Assim, não se poderia
afirmar que o alho importado pela empresa seria substituto do alho produzido no
Brasil, pois não causaria dano à indústria doméstica.
A importadora recordou ainda que a descrição do produto desde o
início da primeira investigação seria mais simplificada: na primeira imposição
do direito antidumping sobre as importações do alho chinês, o
produto se restringia apenas ao "alho comum, fresco ou refrigerado";
na primeira revisão do referido direito, a descrição do produto também teria se
restringido ao alho "da espécie Allium Sativum que
se apresenta com as características de cultivo bem definidas, fisiologicamente
desenvolvido inteiro, sadio e isento de substâncias nocivas à saúde"; e na
segunda revisão sobre o tema, o produto teria sido definido como "alho,
fresco ou refrigerado, importado da China".
Já na última revisão, ter-se-ia definido o produto sujeito ao
direito antidumping como o
"bulbo da espécie Allium Sativum que, independente da sua coloração, é
classificado no subgrupo de alhos nobres, das classes 5, 6 e 7, do tipo
extra", restringindo assim, segundo a importadora, as características do
referido produto. Ainda segundo a Massy:
"evidentemente (...) quis o legislador mudar a imposição de tal medida
para incluir apenas o produto atingido no mercado nacional".
A empresa Massy argumentou ainda, ao contrário
do afirmado pela Anapa, que a avaliação de escopo que
culminou na publicação da Resolução Camex nº 13, de 2016, teria discutido tão
somente a incidência ou não do direito antidumping sobre os alhos de classes diferentes,
não tendo tratado dos alhos de tipos distintos.
Por fim, a importadora solicitou que seja respeitada a decisão da
Resolução Camex nº 80, de 2013, que aplicou direito antidumping ao alho classificado no subgrupo de
alhos nobres, das classes 5, 6 e 7, do tipo extra, impedindo assim a cobrança
do referido direito sobre o alho do tipo especial, de qualidade inferior.
Em manifestação protocolada em 7 de abril de 2017, a ANIABrasil - Associação Nacional dos Importadores de
Alimentos e Bebidas afirmou que os atos normativos referentes à incidência do
direito antidumping aplicado
sobre o alho importado da China deveriam ser analisados levando-se em
consideração tanto a Resolução Camex nº 80, de 2013, que não teria apresentado
qualquer distinção quanto à coloração, subgrupo, classe ou tipo do produto
importado, como a Resolução Camex nº 13, de 2016. Essa última teria concluído
que os alhos frescos ou refrigerados de classe 3 e 4 estariam incluídos no
escopo da medida antidumping vigente, da mesma forma que os alhos
de diferentes classificações, tendo, portanto, colocado fim ao conflito de
interpretação relativo ao alcance da medida antidumping.
A associação solicitou também que a Receita Federal do Brasil
fosse convidada a participar da audiência pública prevista no parágrafo único
do art. 152 do Decreto nº 8.058, de 2013, cujo objetivo seria esclarecer
aspectos relativos ao escopo da medida antidumping em vigor, de modo a solicitar à
referida Secretaria que coibisse "a nacionalização do alho chinês em
subfaturamento e sem o devido recolhimento dos valores referentes aos direitos antidumping".
Em 24 de abril de 2017, a Associação Nacional dos Produtores de
Alho - Anapa, reduziu a termo os argumentos
apresentados durante a audiência realizada em 17 de abril de 2017.
A Associação inicialmente afirmou que todos os argumentos
ventilados oralmente pelos representantes da Anapa
durante a referida audiência já haviam sido formalizados quando da petição
inicial, inclusive com a comprovação da existência de interpretação equivocada
por parte do judiciário, que teria restringido a aplicação do direito antidumping.
A Anapa citou então os argumentos da
Associação Nacional dos Importadores de Alho, que corroborariam que o direito antidumping teria sido fixado sem nenhum tipo de
critério classificatório, "tanto que todos os dados e análises foram
feitas com base no alho gênero, a partir da NCM".
A Associação reforçou que não haveria mudança no escopo da
determinação do produto objeto do direito antidumping, mas apenas a ratificação
do que sempre foi o escopo. Para a Anapa, a Receita
Federal do Brasil entenderia "que não há limitação com base em qualquer
critério classificatório (...)". E concluiu dizendo que ao final desta
revisão de avaliação de escopo, certamente não haveria "mais subterfúgios
argumentativos aptos a gerarem abalos a produção nacional e déficit na arrecadação pública".
Em 8 de maio de 2017, a Anapa apresentou
suas manifestações finais sobre os elementos constantes dos autos.
Inicialmente, a peticionária afirmou que desde 1996, com a
primeira fixação do direito antidumping sobre as importações do alho chinês,
haveria incidência do direito independentemente de qualquer classificação,
"sendo certo que inexiste pleito expresso e decisão expressa na última
prorrogação da aplicação do direito antidumping sobre qualquer redução de
escopo".
Segundo a Anapa, a Resolução Camex nº
80, de 2013, teria definido, expressamente, que a incidência do direito antidumping incidiria sobre o alho importado da
China, classificado nas NCMs 0703.20.10 e 0703.20.90,
independentemente de qualquer outra classificação.
Com relação à primeira avaliação de escopo do produto objeto do
direito antidumping, que culminou com a publicação da Resolução Camex nº
13, de 2016, já teria sido constatado que inexistiria redução de escopo da classificação
do produto. A Anapa mencionou então trecho da
referida resolução:
A análise deste item do Anexo da Resolução parece, portanto,
indicar que o produto objeto do direito antidumping está classificado de acordo com a
Portaria Mapa nº 242, 1992, sem, no entanto, delimitar sua classificação. Em
nenhum outro momento a Resolução Camex nº 80, de 2013, faz referência à
delimitação ou definição do produto objeto da medida.
Segundo a Associação, a análise realizada pela autoridade
investigadora no último processo de revisão do direito antidumping aplicado sobre as importações de alho
da China não apresentaria nenhum tipo de recorte classificatório, sendo que
teria sido considerado, para efeitos de apuração do valor normal da China, o
alho gênero, e não o alho de uma determinada classe específica ou categoria de
alho.
Para a Anapa, seria absurdo pensar que a
importação do alho Tipo Especial, que tem maior número de defeito agregado por
bulbo, não causa dumping, quando o outro que tem menor
quantidade de defeito causa, se quando da fixação da norma protetiva a análise
foi feita sem nenhum critério classificatório.
Portanto, a tentativa de delimitar o escopo do direito antidumping incidente sobre as importações de alho
originárias da China, por meio de recorte classificatório, implicaria a
ineficácia do próprio direito antidumping.
A Associação lembrou ainda que seria impossível para a autoridade
fiscalizadora a conferência do tipo de alho para a cobrança ou não do direito antidumping.
Por fim, a Anapa solicitou que fosse
publicada nova Resolução Camex, a fim de consignar de forma expressa que o
direito antidumping incide
sobre todo alho importado da China, classificado nas NCMs
0703.20.90 e 0703.20.10, independentemente de qualquer classificação, não
havendo que se falar em restrições ao escopo da medida antidumping,
baseadas na classificação do produto, seja em classes, grupos, subgrupos ou
tipos.
3.4. Dos
comentários acerca das manifestações
Inicialmente, cumpre ressaltar que o procedimento de avaliação de
escopo possui caráter interpretativo e visa a esclarecer aspectos referentes à
definição do produto objeto da medida antidumping. Não consiste em
finalidade do procedimento, portanto, alterar a definição do produto sujeito ao
direito antidumping e
tampouco redefinir o escopo de aplicação da medida. Ocorre que, diante da
existência de dúvidas quanto à incidência ou não da medida antidumping sobre determinado tipo de produto, a
avaliação de escopo deve, justamente, se limitar a emitir conclusão de natureza
declaratória, a fim de tão somente dirimir as eventuais dúvidas.
Nesse sentido, não é cabível, por ocasião de uma avaliação de
escopo, a análise de aspectos referentes à apuração do valor normal, sob pena
de desvirtuar a finalidade do procedimento, a qual se limita à interpretação da
definição já existente do produto objeto da medida. Dessa forma, não são
cabíveis os argumentos trazidos pelas empresas ME RJ e Lecargo
acerca do reconhecimento da China como economia de mercado e consequente
alteração de circunstâncias da aplicação do direito.
Nesse mesmo sentido, ressalta-se a impossibilidade de análise de
aspectos alheios à definição do produto objeto da medida, tais como alegado
risco de desabastecimento do mercado brasileiro ou elevados preços alegadamente
cobrados pelos produtores nacionais.
A empresa ME RJ afirmou que caso fosse necessária a revisão do
escopo da medida, seria necessária restituição de todo o valor do direito antidumping pago indevidamente. A esse respeito,
reitera-se o caráter interpretativo do processo em tela, não havendo que se
falar em revisão do escopo da medida em vigor. Ademais, a finalidade da
avaliação de escopo reside justamente na busca por dirimir dúvidas, a fim de
garantir a segurança jurídica das partes envolvidas. Quanto à alegada
necessidade de restituição de valores pagos indevidamente, caso conclua-se pela
incidência do direito antidumping sobre o alho independentemente de
quaisquer classificações, o que poderia ocorrer é justamente o contrário do
efeito levantado pela empresa, no sentido de que empresas importadoras que até
então não recolhiam direito antidumping passem a fazê-lo.
A empresa ME RJ solicitou, além da realização de audiência, o
envio de questionário e realização de verificações in
loco. Quanto a isso, ressalta-se a realização da audiência no dia 17 de
abril de 2017, para a qual foram convocadas todas as partes interessadas
habilitadas no processo. Quanto à solicitação de envio de questionário e
realização de verificações in loco, considera-se que os dados
apresentados ao longo do processo, juntamente com as informações consideradas
por ocasião da revisão que culminou com a prorrogação do direito em vigor, por
meio da Resolução Camex nº 80, de 2013, são suficientes para instruir sua
conclusão no que diz respeito ao esclarecimento da definição do produto objeto
da medida antidumping.
Por fim, a empresa solicitou o indeferimento do pedido de
avaliação de escopo apresentado pela Anapa e
encerramento do procedimento sem qualquer resolução de mérito ou alteração da
legislação vigente. A esse respeito, ressalta-se que a administração pública
federal não poderia deixar de esclarecer questão que coloca em risco a eficácia
de medida antidumping em
vigor e a segurança jurídica das empresas envolvidas. Nesse sentido, reitera-se
finalidade da avaliação de escopo, no sentido tão somente de dirimir dúvidas
quanto à incidência ou não de determinada medida, não havendo que se falar em
alteração da legislação vigente.
A empresa Lecargo, ao defender a
legitimidade de sua intervenção no pleito, apresentou decisão de agravo de
instrumento por ela interposto. Quanto a isso, cumpre ressaltar que a decisão
em tela remete ao deferimento parcial do pleito da empresa e concede
antecipação de tutela, para fins de liberação de mercadoria retida no porto. No
entanto, a mesma decisão determinou que "a análise sobre o tipo de alho e
a extensão dada pela Resolução 80/2013 para a cobrança da sobretaxa antidumping deverá ser analisada
oportunamente". Não pode, portanto, a empresa, com base na referida
decisão, afirmar haver posicionamento do Poder Judiciário contrário à
incidência da medida sobre determinados tipos de alho.
A Lecargo afirmou, nesse contexto, que o
processo de avaliação de escopo representaria tentativa de tornar ineficazes
provimentos judiciais. A esse respeito, ressalta-se a competência da Câmara de
Comércio Exterior - Camex, reconhecida e destacada por diversas das decisões
apresentadas pela empresa, para a fixação, alteração e extinção de direitos antidumping.
Ademais, reitera-se o propósito interpretativo da avaliação de
escopo, a qual consiste em instrumento instituído pelo Decreto 8.058, de 2013,
para fins de dirimir dúvidas quanto à incidência de uma medida antidumping.
A judicialização da questão apenas ratifica a
importância do referido instrumento, para fins da garantia da segurança
jurídica das partes envolvidas. Não há que se falar, nesse contexto, em desvio
de finalidade na condução do processo de avaliação de escopo, uma vez que ele
visa a, justamente, solucionar as dúvidas que têm ensejado a abertura de
processos judiciais. Nesse sentido, tampouco é verdadeira a alegação da empresa
de que o propósito da avaliação de escopo seria revisar decisões judiciais.
A empresa, além de solicitar a realização de audiência, requereu a
notificação do Ministério Público. Quanto a isso, ressalta-se que a avaliação
de escopo está prevista na legislação, de modo que compete ao Departamento de
Defesa Comercial conduzir o processo e à Camex proferir a conclusão final
quanto à interpretação do escopo da medida. Não há, no entanto, qualquer
previsão legal atinente à intervenção do Ministério Público em processos
administrativos de defesa comercial. Ademais, quanto ao alegado descumprimento
de decisões judiciais, trata-se de acusação da empresa sem qualquer
embasamento, uma vez que a própria decisão trazida por ela aos autos menciona a
necessidade de que medidas administrativas sejam tomadas:
Sendo assim, eventuais medidas administrativas aplicáveis ao caso
concreto devem ser empreendidas pela Administração Pública mediante utilização
dos instrumentos adequados, independentemente da apreensão ou liberação da
mercadoria.
A empresa Massy afirmou não haver dúvida
quanto à definição do produto objeto da investigação enunciada pela Resolução
Camex nº 80, de 2013, qual seja, o alho classificado no subgrupo dos alhos nobres,
das classes 5, 6 e 7 do tipo extra. A esse respeito, cumpre revisitar
conclusões constantes da Resolução Camex nº 13, de 2016. Nesse sentido,
ressalta-se a constatação de equívoco no texto do anexo da Resolução Camex nº
80, de 2013, que definiu o produto objeto da medida antidumping,
o que, de fato, gerou insegurança jurídica e incerteza na sua aplicação.
A esse respeito, reitera-se que a Resolução Camex nº 80, de 2013,
estabelece, explicitamente, que o alho, objeto da medida antidumping,
pode ser classificado em todas as classes, grupos, subgrupos e tipos listados
na Portaria do Mapa. No entanto, a mesma Resolução estabelece também que
"o produto objeto da medida antidumping é o alho importado da República
Popular da China, definido como sendo o bulbo da espécie Allium Sativum que,
independente da sua coloração, é classificado no subgrupo de alhos nobres, das
classes 5, 6 e 7, do tipo extra".
A existência de dispositivos conflitantes, em um mesmo instrumento
legal, inseridos em um mesmo item, além de explicitar equívoco textual, impôs a
necessidade de avaliação abrangente e de interpretação teleológica para
determinação e esclarecimento do escopo da medida. Essa metodologia foi
aplicada para fins da avaliação de escopo relativa aos alhos de classes 3 e 4 e
deve também ser aplicada para fins de dirimir dúvidas quanto à incidência do
direito antidumping sobre
as demais classificações do produto.
A Massy afirmou que, no Brasil, somente
seriam produzidos alhos roxos, do subgrupo de alhos nobres, das classes 5, 6 e
7 e tipo extra. Quanto a isso, ressalta-se, incialmente, não ser possível, por
meio dos dados disponíveis nos autos da avaliação de escopo identificar os
produtos fabricados pelos produtores nacionais. Isso
não obstante, por meio da análise dos dados da indústria doméstica referentes à
revisão que ensejou a prorrogação do direito antidumping em vigor, constatou-se não haver
limitações classificatórias quanto ao alho fabricado e vendido no Brasil.
Nesse sentido, o argumento da empresa contradiz a conclusão de
similaridade relativa ao referido processo de revisão. Com efeito, com relação
à similaridade entre o produto objeto da investigação e o similar nacional,
concluiu-se que:
Conforme constatado desde a investigação original, tanto o alho importado da China, como o alho produzido no Brasil, são
definidos em maior proporção e
independentemente da sua coloração de acordo com as normas da Portaria Mapa nº
242, de 1992, no subgrupo de alhos nobres, classes 5, 6 e 7 e tipo extra. (grifo nosso)
Esse trecho da conclusão acerca da similaridade, apesar de fazer
menção aos alhos nobres, das classes 5, 6 e 7, do tipo extra, deixa claro que
tanto o alho importado da China como aquele fabricado no Brasil se classificam majoritariamente nas classes mencionadas. O termo
"em maior proporção" utilizado no texto indica, de fato, que existem
alhos que estão classificados em outros tipos, classes e grupos, exportados da
China para o Brasil e produzidos nacionalmente.
Ainda nesse sentido, na análise dos dados da indústria doméstica,
empreendida ao longo da referida revisão de final de período, referentes à
avaliação de dano, também não se observa nenhum tratamento segmentado das
informações. Não há nenhuma menção de segmentação do produto em quaisquer
categorias, classes, tipos, subtipos, ao se analisar o comportamento de
indicadores como a produção, vendas e custo do produto similar doméstico. Da
mesma forma, para fins da análise de dumping, com base nos dados da última
revisão, não se identificou segmentação dos dados referentes às exportações
para o Brasil das empresas chinesas, e tampouco daqueles utilizados para fins
de cálculo do valor normal.
A empresa Massy alegou, por fim, que a
avaliação de escopo que culminou na publicação da Resolução Camex nº 13, de
2016, teria discutido tão somente a incidência ou não do direito antidumping sobre os alhos de classes diferentes,
não tendo tratado dos alhos de tipos distintos. De fato, a referida avaliação
de escopo, em respeito ao princípio da congruência, se deteve a determinar que
os alhos de classes 3 e 4 estão submetidos à incidência do direito, tendo em
vista a petição que lhe deu início.
No entanto, não se pode ignorar o fato de que, as análises
empreendidas, no âmbito da primeira avaliação de escopo e reproduzidas, em
parte, no processo em tela, indicam que as informações utilizadas durante o
último procedimento de revisão se referiam ao alho de forma genérica, sem fazer
qualquer segregação dos dados por tipo, classe, grupo ou subgrupo.
A Ania apresentou concordância quanto
aos argumentos da Anapa, de que o direito antidumping incidiria sobre o alho gênero,
independentemente de quaisquer classificações. Quanto a isso, solicitou que a
Receita Federal do Brasil fosse convidada a participar da audiência realizada
em 17 de abril de 2017, com vistas a esclarecer aspectos relativos ao escopo da
medida antidumping em
vigor. A esse respeito, considerou-se não ser necessário convidar representante
da RFB, uma vez que as discussões da audiência se limitariam à discussão do
escopo da medida antidumping em vigor, o que foge, de certa forma,
à função primordial daquele órgão, relativa ao recolhimento das medidas
estabelecidas.
Por fim, reitera-se a existência de dispositivos conflitantes no
texto da Resolução Camex nº 80, de 2013. Diante das dúvidas existentes quanto
ao escopo da medida antidumping, fez-se necessária
análise dos dados da revisão de final de período que ensejou a prorrogação da
medida atualmente em vigor. Os referidos dados indicaram que, para fins de
determinação de dano e dumping, considerou-se o alho de
forma genérica. Reitera-se, ainda, conclusões alcançadas por meio da avaliação
de escopo relativa aos alhos de classes 3 e 4, as quais indicaram não haver
limitações classificatórias quanto ao produto objeto da medida. Dessa forma,
conclui-se que a medida instituída pela Resolução Camex nº 80, de 2013, incide
sobre as importações de alhos frescos ou refrigerados originárias da China,
independentemente de qualquer classificação.
4. DA
RECOMENDAÇÃO
Ante o exposto, concluiu-se que os alhos frescos ou refrigerados,
independentemente de quaisquer classificações em tipo, classe, grupo ou
subgrupo, estão incluídos no escopo da medida antidumping vigente, devendo sofrer a incidência
do direito antidumping em vigor.